Além de ser abjeto, “A Ressaca” (“Hot Tub Time Machine”) roubou o que poderia ser o título em português do excelente “The Hangover” (“Se Beber, Não Case”).
Tudo bem, neste caso vamos culpar os tradutores brasileiros e perdoar o pobre Steve Pink, que já cometeu muitos crimes ao dirigir essa bomba com John Cusak (bom ator que parece patinar em projetos capengas).
Sabemos como funciona uma comédia.
Geralmente é sobre um desconforto, um desarranjo.
Na hora de analisar os melhores textos cômicos, você percebe que a idéia central coloca alguns personagens num mundo/situação que eles não dominam/compreendem.
Dessa inaptidão com o universo vem o riso.
Sendo leviano e reducionista, basta retirar alguém de sua zona de conforto e explorar as situações que poderiam gerar graça.
Claro que temos o humor a partir das possibilidades dessa troca de mundo, dos personagens e do texto.
Quando tudo isso fica em harmonia, eis um “Quanto Mais Quente Melhor” (1959), de Billy Wilder.
Portanto, há infinitas maneiras de transmudar os personagens (ou apenas o protagonista) para essa área caótica.
Valem motivos comuns, exóticos, curiosos… Um enfermeiro que vai visitar o sogro neurótico; uma despedida de solteiro em Las Vegas; a Marilyn Monroe passa a ser sua vizinha; um dia de folga; pobre que vira rico; homem comum tem que assumir a presidência por um dia; atores em decadência perdidos numa selva; indiano sem noção numa festa de milionários.
Alguns roteiristas gostam do perigo e preferem cavar um motivo sobrenatural para fazer essa passagem.
Quando isso é bem construído, o próprio catalisador da ação acrescenta molho à trama, que vira um interessante quebra-cabeça (caso de “De Volta Para o Futuro” – a máquina é tão importante quanto os personagens).
Outros preferem ignorar essa complexidade e criam uma bobagem qualquer apenas para iniciar a comédia.
Em “O Mentiroso”, um apagar de velas faz Jim Carrey dizer apenas verdades. Em “Se Eu Fosse Você” é uma espécie de maldição que permite a troca de corpos. No clássico “Big – Quero Ser Grande”, um pedido feito numa máquina no parque de diversões arremessa Tom Hanks para o mundo adulto.
E neste “A Ressaca”? Bem, é uma jacuzzi encantada que leva quatro marmanjos dos dias de hoje para 1986.
Só que nada funciona. As piadas são estúpidas e escatológicas (Pink precisa de anos de estudo para fazer isso com a graça dos irmãos Farrelly), as cenas previsíveis e chatíssimas, a trama uma desgraça e os personagens desinteressantes.
Nem as homenagens a essa década que por um tempo virou mania (aliás, bom que essa moda passou) animam os fanáticos por polainas e mullets.
Os personagens de “A Ressaca” deveriam ter aproveitado a viagem e conferido nos cinemas “Curtindo a Vida Adoidado”, de John Hughes (este sabia todos os truques do humor), que estreava justamente em 86.
Ou melhor, o filme com o Matthew Broderick pode ser o único remédio para curar o mal-estar que essa banheira provoca.

Bueller. Bueller.
(E ficou bem nesse blog a sua abordagem explicativa da gênese de uma comédia).