Ingleses, Simon Pegg e Nick Frost já podem reivindicar um lugar no panteão das duplas famosas – do cinema, nada de sertanejo.
Eles se celebrizaram ao atuar em filmes de gênero que exploravam temas típicos da cultura pop cinematográfica de Hollywood: mortos-vivos em Todo Mundo Quase Morto; e o suspense policial no ótimo Chumbo Grosso.
Esses dois se passavam no Reino Unido e foram dirigidos por Edgar Wright (de Scott Pilgrim Contra o Mundo e um dos cineastas mais interessantes da atualidade). Agora, numa primeira experiência – escrevendo e atuando – da dupla em solo norte-americano, a comédia surge a partir de duas outras imensas instituições dos Estados Unidos: os nerds/geeks e os ETs (em especial a incrível capacidade que os cidadãos lá de cima têm de capturar alienígenas que, invariavelmente, aparecem para nos destruir).
Paul, escrito por Pegg-Frost e dirigido por Greg Mottola (Superbad, Adventureland), tem todos os códigos de um road-movie pirado, com cabeçudos seres de outro planeta, homens de preto e tiras incompetentes.
É a grande homenagem desses ingleses aos fabulosos nerds que nos anos 70 reinventaram os blockbusters cinematográficos e moldaram a cultura pop dos últimos 30 anos.
O filme começa numa edição da Comic-Con, em San Diego, com sua fauna de orcs, super-heróis, monstros e ewoks. Fascinados, Pegg-Frost são mais um daqueles sonhadores, mentes criativas esperando a sorte grande. Afinal, onde mais alguém desenha uma mulher de três tetas e logo pode ser saudado como um gênio? Só na tal da América (pelo menos parece que tem gente que ainda pensa assim).
Ao visitar uma rota alienígena, atravessando cidades e estados onde supostamente foram avistados extraterrestres e naves vindas dos rincões do universo, os dois trombam com um ET de verdade – chamado de Paul em homenagem a um cachorro que o alien matou quando pousou na Terra.
Dublado por Seth Rogen (Ligeiramente Grávidos, Besouro Verde), Paul dá uns tapas em baseados, faz bundalelê, curte um palavrão e foi o mentor de Steven Spielberg (não por acaso o filme é uma insana mistura de Louca Escapada, Contatos Imediatos do Terceiro Grau e E.T. – O Extraterrestre). Enfim, é praticamente um humano – daqueles antigos, pois também fuma.
Fugindo de misteriosos agentes do governo que pretendem arrancar as suas células cerebrais, o alienígena quer se mandar deste planeta. Ao contar com a ajuda dos britânicos, o trio acaba cruzando com a insalubre “América profunda”, travando duelos com toscos caipiras e violentos criacionistas.
Desde a primeira cena, estamos diante de uma saudação da cultura nerd/geek e uma paulada nesse Estados Unidos forjado embaixo de oito anos do governo Bush – afinal, só agora o pobre ET tem que se mandar; parece que o território norte-americano ficou um lugar árido para se viver, sem espaço para o diferente ou o excepcional.
Paul não veio – ainda? – para os cinemas brasileiros. Pena. É uma das comédias mais inventivas e bem estruturadas do ano.
Além da óbvia sátira ao povo norte-americano (aí incluindo os nerds/geeks) e uma rica gama de citações ao universo da ficção-científica, Paul traz um roteiro amarradíssimo, com uma rara capacidade de não deixar nada para trás.
Eis um dos grandes problemas que encontramos em lugares como o Brasil, onde os filmes ainda penam para erguer sua dramaturgia: muitas situações e personagens simplesmente são abandonados pelo caminho.
Em Paul, cada cena tem sua própria potência interna (geralmente causando comicidade pela situação surreal) e também agrega elementos à trama, recheando o filme com personagens, objetos e detalhes que serão recuperados mais tarde.
Vale observar como cada elemento aparece e é retomado em algum ponto da narrativa. Uma pequena lista para ser identificada: o ursinho da menina no início; o carro batido dos caipiras; a espada; as referências ao famoso escritor de nome esquisito etc.
Nada é desperdiçado. Além disso, nos sentimos lisonjeados de ver algo em que a informação é transmitida sempre de uma maneira atraente, divertida e surpreendente – o melhor exemplo disto talvez seja o jeito como descobrimos que Paul tem o dom de ressuscitar os mortos.
Será que filmes assim são exibidos em aulas de roteiro no país?
Atenção, turma, Paul tem diversas lições para ensinar. E isto não é uma piada.

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