A quinta temporada de Mad Men chega ao fim reafirmando a grande sacada de seu criador, Matthew Weiner: explorar personagens e eventos da década de 60 que estavam sufocados pela superexposição dos dramas e conflitos dos jovens rebeldes, os grandes símbolos do período.
A série mostra que existiam donas-de-casa, trabalhadores, empregados, patrões, toda uma turma que não saia na rua distribuindo flores, queimando sutiãs ou discutindo a paz. Eram pessoas que seguiam suas vidas e olhavam tudo de fora, ainda tentando compreender qual partido tomar – e se é que precisavam de algum partido.
Mad Men é apaixonada pelos Outros, os “normais”, apagados dos grandes eventos ou dos livros de história. Ele fala da tal classe média abastada, desconfiada, que prefere ver para crer.
No início, o público aplaudiu os episódios pois mostravam engravatados fumando e bebendo no serviço. Foi uma reação perfeita a uma certa tendência de caretice na TV por causa da força do politicamente correto na América. Já que os autores não poderiam mostrar cigarros e drinques correndo soltos nos escritórios de hoje, a solução foi contar histórias sobre o passado recente, quando até os médicos incentivavam a fumaça.
A tal onda que promoveria o banimento da ousadia e da sacanagem na televisão norte-americana de fato nunca se confirmou – ainda bem. Basta ver um episódio de Girls, por exemplo, a divertida série da “fofa-doidinha” Lena Dunham, pra gente observar sexo, beijo gay aos montes, consumo de drogas e irresponsabilidades mil. Tudo aí, de forma divertida e cool.
Mad Men, portanto, mesmo sendo bem maliciosa e safadinha, não faz sucesso apenas porque Don Draper e companhia podem fumar em paz e tomar seus porres na hora do almoço. Creio que Weiner encontrou um grande filão ao descortinar como era o cotidiano dos Outros nos conturbados e míticos anos 60.
A quinta temporada começa no verão de 1966. Daí em diante, até o início dos anos 70, os EUA passariam por assassinatos traumatizantes (Martin Luther King, Bobby Kennedy), a subida de Nixon ao poder, o primeiro pontapé de Neil Armstrong na Lua, Woodstock e aqueles conflitos com as minorias que todo mundo já espiou pelo menos um trechinho.
Estamos acostumados a ver – e entender – a dramaturgia daqueles guerreiros hippies nas ruas. Somos capazes até mesmo de desenhar a figura clássica de uma garota vendo as diabólicas contorções de Jimmy Hendrix num palco enlameado. Mesmo quem nasceu muito longe dos anos 60, hoje consegue fechar os olhos e imaginar uma época colorida, alternando um pouco de contestação com drogas alucinógenas e meia dúzia de moleques com os cabelos compridos.
Mas Mad Men ensaia um outros anos 60, daqueles que estavam sendo atropelados pela moda enquanto ainda detinham certo poder. Assim como o genial publicitário Don Draper, muitos enfrentavam a crise da meia-idade enquanto viam – sem entender muita coisa – suas mulheres querendo algo mais do que o matrimônio, seus filhos ficando meio sem rumo e suas vidas sendo invadidas por jovens com uma causa.
A série fala sobre aqueles que não foram para o Vietnã, dos empresários e funcionários que ficaram em casa buscando uns trocos para financiar o velho sonho americano.
Sterling Cooper Draper Pryce, a agência de publicidade de Mad Men, engloba os excluídos da revolução, aqueles que tinham a árdua missão de vender a antiga e fantasiosa América dos anos 50 para os confusos e rebeldes consumidores do final dos 60.
É o ponto de vista de quem detinha o padrão moral e econômico, de quem estava por cima. Forçando a barra, é o ponto de vista do pai – enquanto estamos acostumados a sempre ter a visão do filho.
Portanto, nada mais natural do que essa quinta temporada ter sido sombria em muitos aspectos (leia aqui uma seleção de trechos marcantes elaborada pelo site da revista Rolling Stone norte-americana).
Don Draper, como representante desse tipo que tem poder, mas não sabe o que está acontecendo com seu reino, continua em queda livre.
Weiner conseguiu criar um fantástico universo com essa classe endinheirada, mas que estava encravada entre o Darth Vader (Nixon) e as tropas do bem (os rebeldes, que tentariam desmontar o sistema).
É sempre fascinante descobrir um novo mundo de personagens, de pessoas que antes dormiam sombreadas por filmes e séries que mostravam somente as pontas do processo.
Ao ficar com esses sujeitos em cima do muro, Mad Men nos traz uma visão crítica da história, às vezes elogiando a garotada, em outros momentos torcendo para que tudo dê certo para os velhos guerreiros.
A série é sobre tomada de decisões: afinal, você está do lado de quem? E isso nos pega, pois enche nossa cabeça de complexidade, alternando razão e emoção.
Se depender da capacidade dos roteiristas e da quantidade de acontecimentos históricos que vêm pela frente, Draper vai continuar caindo.

Deixe um comentário