“Corações Sujos” e “360”

Abaixo, duas resenhas publicadas na revista Rolling Stone sobre filmes dirigidos por brasileiros. Os dois longas mereciam melhor sorte no circuito. O primeiro, Corações Sujos, de Vicente Amorim, é um competente retrato de uma história fascinante. Além disso, trabalha com rigor num gênero pouco encenado por aqui.

O segundo, 360, traz talvez a melhor direção de Fernando Meirelles. Uma câmera muito segura e afável segue diversas histórias que correm pelo mundo. Se fosse dirigido pelo Woody Allen, diriam que “mesmo sendo menor, é melhor que as outras coisas que estão em cartaz”. O clichê nunca vale para certos diretores. Uma pena. Como é do Fernando, parece que existe a obrigação de ser algo que “represente o Brasil lá fora” e mude a história do cinema – além de certos grupelhos adorarem detonar um brasileirinho de sucesso. Enfim, o filme cumpre o que promete. E isso é o que importa.

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Corações Sujos

Quem só olha o topo da bilheteria pode achar que o Brasil produz apenas comédias ligeiras ou filmes com o Capitão Nascimento. Mas o verdadeiro ouro cinematográfico está mais embaixo da tabela, onde a diversidade de temas impera e é capaz de gerar um inusitado filme intimista de guerra como Corações Sujos.

Baseado em livro de mesmo nome de Fernando Morais, o longa vai ao passado para narrar uma história baseada em fatos reais e pouco conhecida. Logo após a Segunda Guerra Mundial, a colônia nipônica em São Paulo se viu mergulhada em assassinatos, prisões e tumultos.

Além da repressão policial, os imigrantes sofriam com uma terrível divisão interna. Parte da comunidade de japoneses no Brasil simplesmente não acreditava que seu país tinha perdido a guerra. Para esses, a notícia da rendição era uma fraude usada para desestabilizar os ânimos dos guerreiros do Japão. Assim, eles resolvem pegar em armas e matar os derrotistas (os tais corações sujos).

O enredo foca em um fotógrafo no interior de São Paulo, que se vê obrigado a tomar partido em um confronto brutal e trágico. Com poucos diálogos (quase todos em japonês) e elenco impecável, o filme é um sensível e atual relato sobre intolerância e fundamentalismo.

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360

O último filme de Meirelles, Ensaio sobre a Cegueira, mostrava a Terra sendo transformada em um inferno. A recepção da crítica não foi das mais calorosas, manchando um tanto a carreira internacional do diretor brasileiro.

Agora, ele reaparece com 360, longa-metragem elegante, amoroso, com uma violência apenas implícita e andamento leve, com diversos respiros para a felicidade.

O roteirista Peter Morgan se baseou na peça Ronda, de Arthur Schnitzler, para compor diversas histórias de casais que se cruzam pelo planeta. Assim, seguimos matrimônios mutilados, que precisam se reinventar. Seja em Londres, Paris ou em um aeroporto norte-americano, os personagens tentam agarrar uma chance para começar de novo.

Excelente diretor de elenco, Meirelles tira boas atuações de Rachel Weisz, Bem Foster e Jude Law. Mas quem dá o tom do filme é Anthony Hopkins, um pai em busca da filha desaparecida, que faz um brilhante monólogo sobre como devemos seguir em frente mesmo quando a torcida joga contra.

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