Parodiando o Abraham Lincoln – que agora também caça vampiros –, já podemos dizer que uma novela pode ser boa algum tempo; uma novela pode ser ruim todo o tempo; mas uma novela jamais pode ser boa todo o tempo.
Avenida Brasil, de João Emanuel Carneiro, entra no seu último ato totalmente esgarçada, cansada, tropeçando em erros e pulando os acertos. Se é quase impossível manter um segundo ato dinâmico e caprichado em filmes de duas horas ou peças de uma hora e pouco, imaginem o que é segurar as rédeas de um drama por uns 50, 60 capítulos nos quais pouca coisa acontece.
A turma do João está tentando ficar montada num daqueles bois de festa de peão, de rodeio norte-americano. O bicho entrou na arena furioso, pulando de lá pra cá, jogando o chifre para o céu, como se quisesse acertar Deus. Como ficar mais de alguns segundos num monstro desses?
Os roteiristas devem estar escrevendo os capítulos lá em Bragança, terra da linguiça. Porque aqueles suspiros de amor e carinho que vinham lá da sala de TV, agora se transformaram em escárnio e bronca.
Antes era um elogio por metro cúbico no ônibus. Todo mundo comentando a perspicácia da Nina, a gritaria da Carminha, as sacanagens de Leleco. Agora, a garota vingativa é uma anta; a megera foi domada e poderia se mandar para bem longe; o velhote tarado não passa de um babão chato. O povo ficou revoltado.
(Paradoxo: só um núcleo conseguiu manter o mesmo índice – de desaprovação, é verdade – desde o início da novela. A turma do Cadinho nunca caiu nos braços do povo.)
O que eu quero saber é: dava para evitar esse rebaixamento? O problema é do técnico ou do time? Ou a regra do jogo é clara, e um dia a casa cai porque em algum momento uma equipe desaba?
Não tenho acompanhado com assiduidade a novela, mas minhas fontes revelam que parte do desastre poderia ser contornado. As cenas que vi ultimamente foram de uma miséria que beirava o desleixo. Aquela prisão da Nina me deixou confuso: a situação se realizou de uma forma tão infantil, que pensei estar diante de Carrossel.
As revistas de fofoca dizem que a coisa vai piorar, pois a Nina pode se transformar num dos personagens mais estúpidos da dramaturgia nacional. E agora?
A estrutura da novela encaminha qualquer roteiro para o perigoso abismo da incredulidade e do tédio. João Emanuel tinha conseguido injetar energia no formato, principalmente abusando dos cliffhangers (mais aqui) e de atores excepcionais. Só que o gancho traz esse problema para um time relativamente pequeno de personagens: uma hora a gente cansa. Nossa sede por novidades cresce e é alimentada diariamente com um filé mignon. Mas aí mudam para carne de segunda. De repente, não queremos mais ver outra aventura do Flash Gordon e trocamos de herói.
Talvez esse tenha sido o deslize de João Emanuel. Não temos mais surpresas no retão final. Teríamos que ter mais dois ou três craques chegando agora na novela. Ainda há tempo. Um cara para resolver e colocar fogo no jogo. Mas tem que ser fera. Assim como no futebol, brasileiro é passional com novela. Não quer nem saber. Quebra tudo mesmo.
A coisa boa é que podemos discutir estrutura. João sabe escrever para a TV como poucos e domina bem esse jogo perigoso. É como disputar o Brasileirão comandando o Corinthians. A rapaziada só se contenta com o título, com o melhor.
Creio que Avenida Brasil já se entranhou na mente do pessoal. Mesmo se vier o rebaixamento, nunca mais vão abandonar esse time. De certa forma, algo está acontecendo nessa seara.
Bom mesmo é esquecer a novela e ver Tropicália nos cinemas. Ali encontramos um interessante debate cultural. Mas falamos mais depois porque ainda dá tempo de Avenida Brasil se dar melhor que o Palmeiras.

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