Tem coisas que só o Brasil faz por você. Já que meio mundo está envolvido numa guerra por causa desse filmeco anti-islâmico, por aqui o deputado Protógenes Queiroz (PC do B – SP) também resolveu entrar na briga contra o cinema. Só que em vez de acertar a obra A Inocência dos Muçulmanos, pegou no pé do Ted, de Seth MacFarlane.
Péssima época para ser diretor de filmes, não?
Quanto aos provocativos minutos contra Maomé, Janio de Freitas escreveu esses dias um excelente artigo sobre liberdade, imprensa e abuso. Sérgio Augusto também falou um pouco sobre a polêmica.
Agora, e o que comentar sobre a atitude do deputado Protógenes? Muita coisa. O pessoal se mobilizou rapidamente. Além dos pitacos dos leitores nas notícias, li as broncas de Pablo Villaça, André Barcinski e a boa glosa de Xico Sá.
Ted é uma engraçada fábula sobre a moçada que tem quase 40 anos e insiste em viver na adolescência. Isso é ruim? É o que o Judd Apatow vem tentando descobrir nas suas produções. O tema “adulto-moleque-que-ama-seus-amigos-e-nada-mais” é o mais explorado nas comédias norte-americanas dos últimos anos.
Seth MacFarlane, também criador de Uma Família da Pesada, é um pouco mais ácido e grosseiro do que Apatow, mas a ideia é a mesma. Ele fez algo divertido, com uma bela sacada inicial e boas piadas.
E então o Protógenes ficou ofendido. Abaixo, reportagem publicada no sítio do Estadão sobre o fato. Em itálico e negrito, umas pequenas reparações que faço em relação ao conteúdo proferido pelo deputado – só para a barbaridade não passar em branco por aqui.
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“O deputado Protógenes Queiroz (PC do B-SP) disse que pedirá nesta terça-feira, 25, aos Ministérios da Justiça e da Cultura que suspendam a exibição do filme Ted, de Seth MacFarlane, que estreou sexta-feira. Mark Wahlberg interpreta solitário que só tem a companhia do amigo Ted. Protógenes assistiu ao filme com o filho Juan, de 11 anos. ‘Fiquei chocado e indignado com esse filme. Ele passa a mensagem de que quem consome drogas, não trabalha e não estuda é feliz’, disse Protógenes.”
Errado. O deputado não entendeu o filme. O Mark Walhberg não está feliz porque é impossível consumir drogas, não trabalhar, não estudar e ficar com a Mila Kunis para sempre. Portanto, o coitado tem que escolher entre a boa vida de um vagabundo e a Mila Kunis. Escolha miserável, não? Sinceramente, ainda estou pensando numa resposta para esse dilema. Pois é. O filme é triste.
“O deputado, também delegado da Polícia Federal, criticou os Ministérios da Justiça e da Cultura por terem liberado o filme para maiores de 16 anos. ‘Não poderia ser liberado nem para 16 nem para 18 anos. Esse filme não pode ser liberado para idade nenhuma. Não deve ser veiculado em cinemas’, afirmou.”
Errado. O deputado – e delegado – então quer censurar um filme. O deputado está no país errado. Ou na época errada, vai saber.
“Protógenes disse que, como deputado, pedirá explicações dos dois ministérios sobre a liberação do filme. O deputado postou sua indignação com o filme no Twitter. Informou que levou o filho Juan. O assunto repercutiu na internet e ficou entre os trending topics de Brasília, São Paulo e Rio, entrando na lista de temas mais falados no País nesta segunda-feira, 24. Houve uma enxurrada de respostas e críticas. Um dos comentários lembrou que o filme não é infantil, mas para maiores de 16 anos. ‘Desculpas, mas esse filme é um absurdo’, rebateu Protógenes.”
Certo. É absurdo mesmo. Ursinhos de pelúcia não têm vida. Por isso é engraçado.
“Ele afirmou que costuma levar o filho para ver filmes com classificação para adolescentes. ‘Se a faixa etária é para 18 anos, ele não vai; se é para 16, como esse Ted, eu levo, porque ele já é pré-adolescente. Vi a sinopse e pensei que poderia levar meu filho. Mas logo no início o filme apresenta cenas com drogas, até mesmo com modernos aparatos para o consumo de crack’.”
Tudo errado. Para que temos a classificação indicativa, então, se nem o deputado respeita? O Protógenes deveria pedir o fim da classificação, e não pular o critério. Agora, num ponto o deputado até tem razão. Vejam a sinopse do Guia da Folha: “Ted, o urso de pelúcia de John, ganha vida e eles se tornam melhores amigos. Já adulto, John precisa definir entre manter a amizade ou o namoro”. De fato, deixa de fora a ideia central do filme: é para adultos. O que me lembra a frase de Christopher Hitchens, que foi fazer jornalismo em parte para nunca ter de depender da imprensa para se informar. Quem mandou seguir só uma sinopse? Quanto aos tais aparatos modernos para consumo de crack… Uau.
“Protógenes disse que o filme é desrespeitoso, ‘endossa atitudes criminosas, satiriza o consumo de drogas e de álcool e instrui o espectador a não estudar e a não trabalhar’. Segundo o deputado, é ‘um filme agressivo’.”
Errado. Em nenhum momento o filme endossa atitudes criminosas – puxa, o deputado não prestou atenção mesmo. Sim, ele satiriza o consumo de drogas e álcool. Mas, pelo que eu entendi, segundo o deputado, isso seria bom, não? E errado, o filme não instrui ninguém, porque filme não ordena nada, não faz lei, não é vivo, não é deputado.
“Ele afirmou que, ao conversar com o filho sobre o conteúdo do filme, outras crianças ao lado disseram: ‘Tio, estamos sabendo, aquilo é maconha’. Ele lembrou que acompanhava o filho, mas havia crianças sozinhas.”
Errado. Ficou falando durante o filme. Não pode.
‘”Logo na primeira cena, falei para Juan que havia coisas erradas no filme. Ele respondeu: ‘Já sei, papai. Esse ursinho é preguiçoso, só quer saber de fumar maconha e crack, não trabalha, vive de bico, não estuda’. Eu ainda falei que quem não estuda e não trabalha acaba consumindo drogas, tentando ajeitar as coisas. Protógenes disse que o filho perguntou se ele queria ir embora. ‘Respondi que não. Queria ver até onde ia aquele desrespeito’.”
Certo. O filho do deputado entendeu tudo, o Protógenes, não. Mesmo assim, quis ficar até o fim. Precisa comentar?
O deputado afirmou ainda que uma das cenas que mais chamaram sua atenção foi quando o ursinho Ted liga a televisão e aproveita para consumir drogas.
Não entendi. O deputado está criticando as drogas ou a televisão? Eu também gostei dessa cena.
Protógenes disse ainda que ficou indignado ao ver um herói de sua juventude – Flash Gordon – usando cocaína.
Mas por causa da cocaína o herói da juventude do Protógenes continua na ativa e salva o mocinho. O deputado deveria ter ficado feliz ao observar que o Flash Gordon ainda está inteiraço. Aliás, alguém poderia mandar só essa frase para o Seth MacFarlane. Ele iria gostar.

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