Em defesa do Oscar 2013 – 1

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Está aberta a temporada de caça ao Oscar. Isso significa que críticos e resenhistas vão descer a lenha na principal festa de Hollywood. Já começaram a pipocar por aí textos falando que as indicações para O Lado Bom da Vida, por exemplo, revelam a “mediocridade reluzente do Oscar” (como diz José Geraldo Couto).

Como estamos falando de um prêmio, com suas regras e votação específicas, óbvio que todos nós temos as nossas preferências e externamos desconforto ou alegria a partir das escolhas dos vencedores.

Deixando o gosto de lado, realmente dá para sinalizar o estado das coisas nos cinemas a partir da lista dos indicados – já que hoje a mostra é boa, com nove representantes na categoria principal, a de melhor filme.

Pois analisando apenas dois quesitos – roteiro original e adaptado – creio que consigo afirmar que temos pela frente um Oscar dos mais interessantes – muito bom, pra falar a verdade.

Se pela escolha dos indicados podemos traçar um panorama de como andam as narrativas cinematográficas, eu diria que o mundo vai bem, obrigado.

Eu desconfio muito da qualidade de um crítico quando ele é capaz de generalizar o cinema apontando que “Hollywood só produz porcaria”.

Numa breve análise sobre os cinco indicados na categoria de Melhor Roteiro Original, por exemplo, é impossível não constatar qualidades em cada um – e até mesmo inovações interessantíssimas.

A safra, portanto, está ótima. Vamos ver:

AMOUR
Já falei um pouco dele aqui. Uma peça sobre a proximidade entre amor e morte, mas cheio de vida (ainda acho uma exaltação dela, a vida). Quase que inteiramente dentro de um apartamento e com poucos atores (80% com dois atores). Erudito e com uma tese bem clara, mas cheio de espaços em branco, que permitem a participação intelectual do espectador. Belíssimo em muitos momentos e revelando em cada segundo a mão firme de Michael Haneke, roteirista e diretor capaz de equilibrar emoção e sofrimento com bastante rigor. Seria o representante adulto da sofisticada – mas falida – Europa.

DJANGO UNCHAINED
Também comentei sobre o roteiro de Quentin Tarantino aqui. Em três atos, um prazeroso plano de vingança contra a elite branca dos Estados Unidos. Perspicaz e iconoclasta, o texto tem muitas entradas, passeando pelo western spaghetti, literatura alemã, história norte-americana etc. Além de fornecer formidável iconografia sobre a formação de um país. Acima de tudo, um filme estruturado por um nerd, um especialista em narrativa capaz de oferecer um prazer incomensurável para quem está no cinema. Representante de Hollywood e de um gênero norte-americano por excelência. Joga em casa e deve levar.

flight

FLIGHT
Uma surpresa das mais agradáveis. Uma história tão boa, que parece feita antigamente, quando nem tudo precisava ser “baseado em fatos reais”. John Gatins, o roteirista, pescou várias coisas de seus próprios problemas com a bebida para narrar a trajetória de um piloto de avião alcoólatra. Gatins foi tentar a sorte em Hollywood como ator, mas acabou ganhando reconhecimento como escritor. Apesar de um final meio mequetrefe, com uma virada de personagem bem esquisita, o filme é ótimo. Há um fenomenal nó na audiência. Afinal, o protagonista é um “bêbado heroi” ou apenas “bêbado”? Uma obra sobre o vício com muitas virtudes. Zebra que sabe jogar bem. Gatins pode levar o título mais pra frente.

MOONRISE KINGDOM
Outra obra delirante e muito satisfatória escrita por Wes Anderson e Roman Coppola (mais aqui). Um rito de passagem elegante e super cool, mas sem excessos de ironia hipster. Temos crianças exercendo o direito de serem fantasticamente livres; e adultos lutando para se tornarem felizes outra vez. Com um ritmo impressionante e deliciosas passagens, um longa fofinho (mas no bom sentido). É o time que joga bonito e parece estar lá mais para se divertir do que para ganhar.

ZERO DARK THIRTY
Depois de muita discussão e pancadaria por causa dos outros quatro indicados, eu escolheria Zero Dark Thirty como o melhor do ano nessa categoria. O roteiro de Mark Boal parece ter um protagonista (a agente da CIA que caça Bin Laden), mas, na realidade, o centro da trama é a própria caçada. Nada importa mais do que a vontade de pegar o terrorista mais famoso do planeta. Tudo é concentrado nas ações dos agentes: tortura, explosões, planos etc. Acompanhamos os bastidores de uma busca internacional, as horas mortas antes de uma ação militar, a politicagem e, principalmente, o impressionante ataque final. Não temos história de amor, babação, fragmentos psicológicos, nada. A gente nem sabe de onde aquela garota saiu. Como torcer num filme sem um protagonista forte, com pontos de identificação? Boal joga fora os manuais e parece mencionar que “esses caras estão caçando Bin Laden, então fique com eles”. Muita coisa brota das entrelinhas e das expressões desses agentes. Um desbunde.

E então? O cinema está realmente num péssimo período? Depois falamos sobre os roteiros adaptados, com pelo menos uma obra-prima: Lincoln.

Abaixo, os indicados do ano passado, que também podem muito bem entupir as trombetas daqueles que insistem em proclamar o apocalipse (Woody Allen levou com Meia-Noite em Paris).

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