Fracassados aos 20, 30 e 40 anos

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Não sei se This Is 40, o mais recente filme escrito e dirigido por Judd Apatow, vai estrear nos cinemas por aqui. Nos Estados Unidos ele faturou US$ 67 milhões (meia boca) e teve uma recepção geral bem morna. Esse retrospecto um tanto “loser” corresponde exatamente ao espírito do filme. Ele trata de pessoas comuns que patinam no mesmo lugar enquanto cuidam dos filhos, vão ao banheiro apenas para ficarem um pouco sozinhos e observam a carreira profissional estagnar.

Parece uma comédia, mas é tristíssimo. Claro, não faltam boas piadas (alguns chistes são de fato antológicos), mas a espinha dorsal da coisa toda é relatar o cotidiano de personagens parecidos com algumas pessoas que conhecemos (parecidos com a gente que se aproxima dos 40 anos, na verdade), que não vão enfrentar reviravoltas miraculosas capazes de transformar a vida num vale de alegrias e esperança.

O filme é uma espécie de continuação de Ligeiramente Grávidos (2007). Aqui temos de volta o casal Pete (Paul Rudd) e Debbie (Leslie Mann), que na obra anterior ajudavam Alison (Katherine Heigl)) e Ben (Seth Rogen) a enfrentarem uma gravidez indesejada. Agora, na semana em que cada um completa 40 anos de idade, Pete e Debbie tentam entender como tocar a vida pra frente sem depender do fôlego da juventude e cuidando das filhas Charlotte (Iris Apatow) e Sadie (Maude Apatow).

This Is 40 apresenta mais uma sucessão de cenas do que propriamente uma trama. Apatow dá uma banana para a narrativa convencional, jogando fora bons personagens coadjuvantes (como o interpretado por Jason Segel) e concentrando sua força em sequências isoladas, formando quase um documentário – bem esquisito – sobre um casal.

Tudo soa ainda mais estranho (porém, estranhamente bom) quando imaginamos que Leslie Mann é a mulher “na vida real” de Apatow. E ainda: as filhas do casal protagonistas são interpretadas pelas crias do diretor.

Como alter ego de Apatow, Paul Rudd dá um show, segurando com brio as piadas escatológicas (solta peidos e procura gonorréia com um espelhinho) e enchendo de ternura sua obsessão por música de qualidade.

O longa aos poucos se torna uma interessante e melancólica crônica (bem grandinha, com mais de duas horas) sobre o matrimônio e o envelhecimento.

Chutando o pau da barraca, é um Amour desavergonhado e irresponsável.

Ele não carrega na comicidade como os irmãos Farrelly fizeram com Hall Pass, quando também demonstraram a loucura que é ter 40 anos – aliás, que filme engraçadíssimo. Mas sim aposta num tom bem mais baixo, constrangedor. Fazer 40 anos, ser casado, permanecer fiel… Essas coisas todas são bem mais complicadas do que parecem.

Por todas as sequências vemos pessoas infelizes, sexo atrapalhado, desejos reprimidos e muita falação e gritaria. Tudo poeticamente muito próximo daquilo que chamamos de vida real.

O fracasso é visto como uma coisa normal, até mesmo inerente. Mesmo um personagem com sucesso profissional, caso do pai de Debbie, feito por John Lithgow, é um monumental desastre na vida familiar.

Ao aceitar essas falhas de caráter de todos os seus personagens (Albert Brooks, pai de Pete, é o pior de todos), This Is 40 se revela muito humano e sentimental.

Ser um perdedor não é o fim do mundo. Ou não deveria ser, pelo menos. Há muitas outras coisas que podemos fazer.

A garota da hora, Lena Dunham, também faz uma ponta no filme. Nada mais natural, já que a série que ela dirige, escreve e atua, Girls, é produzida por Apatow.

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Pois os primeiros quatro episódios da segunda temporada do título (exibido pela HBO) trazem os maiores perdedores da TV atualmente.

Ninguém consegue trepar direito, falar direito, comer direito, andar direito. No quarto episódio, Ray, o barista interpretado por Alex Karpovsky (que acaba de estrear dois filmes dirigidos por ele nos EUA) faz um dolorido discurso sobre sua incrível capacidade de ser um loser. Ele fala algo com “tenho 33 anos e sou um fracassado”. Logo depois, no final do capítulo, há uma impressionante sequência numa banheira, cheia de maturidade e dramaturgia, quando duas amigas se encontram e brincam com a falência de suas escolhas.

Parece que agora Lena Dunham está causando polêmica pois colocou sua personagem, Hannah, para namorar com Patrick Wilson (sinal de um irreal sucesso, segundo alguns críticos).

Não importa. Até onde eu vi, Girls capricha ao falar sobre os fracassados de 20, 30 anos. Talvez por isso tenha conseguido atingir tanta gente. É um This Is 20 e Poucos.

EM DEFESA DO OSCAR – 2

Aqui falei sobre os roteiros originais indicados para o Oscar deste ano. Ainda dá tempo de comentar alguma coisa sobre os filmes que concorrem na categoria Roteiro Adaptado.

O André Barcinski deu umas pauladas na estatueta peladinha e comentou que não premiaria ninguém (leia o texto aqui).

Puxa, quanta crueldade. Não é segredo que acho Lincoln uma obra magistral e o roteiro de Tony Kushner é sublime (mais aqui). Aliás, outro dia vi uma entrevista do roteirista no programa Milênio da Globo e, em dois minutos, ele falou mais coisas interessantes e pertinentes do que a gente encontra em toda produção intelectual de muita gente por aí.

E os outros concorrentes?

Argo, roteiro de Chris Terrio, é um competente estudo sobre a encenação produzida pela política (e por Hollywood, claro).

A Vida de Pi (roteiro de David Magee) se concentra com maestria na “amizade” entre um tigre e um garoto. Há surpresas na medida certa, um ritmo bem interessante e uma primeira hora deliciosa, capaz de pegar o mais sisudo dos seres.

Indomável Sonhadora, de Lucy Alibar e Benh Zeitlin, vem de um texto para o teatro. No filme, poesia visual e verbal casam bem em interpretações esmeradas.

O Lado Bom da Vida, de David O. Russell é um curioso equívoco (mais aqui).

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