Somos Tão Jovens e Faroeste Caboclo trazem uma boa notícia para o cinema nacional: Brasília está nas telas. Graças a essa paixão por Renato Russo – “tema” dos dois filmes -, podemos perceber mais uma vez como a capital do Brasil pode ser útil para a evolução dos nossos roteiros.
Sou a favor de uma cota de tela para a exibição de histórias passadas no Distrito Federal. A cada dois filmes brasileiros, um deveria acontecer naquele lugar esquisitão.
Um canto do país tão diverso, capaz de concentrar tantas histórias interessantes, não pode ficar abandonado.
Temos que transformar Brasília em nossa Washington.
Lá dá pra fazer de tudo, de luta de classes (tem miséria pra valer e um monumental fosso entre rico e pobre) até uma coisinha que ninguém mexe por aqui: histórias políticas; Sem contar o visual, aquelas avenidas ótimas para um corre-corre da turma dos Velozes e Furiosos e, pra completar, a chapada ali do lado.
Cinema é muito caro e tem um único dono (esse tal de Rouanet)? Ok, vamos de séries então.
Dia desses a Folha de S.Paulo destacou a pancada de séries que retratam a vida política de Washington. Scandal, House of Cards, The Americans, Homeland e 1600 Penn foram citadas. Se a gente conseguisse realizar uma (uma!) série política porreta em Brasília já seria uma glória.
E não precisa gravar lá, não. Tudo em estúdio, mas captando o ar seco da capital pelo menos na espinha dorsal do negócio.
Só pelo registro, a melhor série cômica atualmente nos EUA é Veep, que se passa em? Washington.
Voltando aos filmes. Somos Tão Jovens, de Antonio Carlos Fontoura, mostra a ascensão (sem queda) de Renato Russo. No final dos anos 70, ele forma o Aborto Elétrico e junto com uma turma do barulho inaugura o punk ao redor do lago Paranoá.
Apesar de a gente se acostumar aos trejeitos de Thiago Mendonça (que interpreta Renato), o roteiro de Marcos Bernstein é bobinho, didático, anunciando todas as emoções e deixando diversas cenas escaparem. Tudo é picotado, rápido, sem nenhum envolvimento. Um personagem está chateado e de repente diz: “É isso aí, vou formar uma banda com meu amigo Marcelo Bonfá”.
De qualquer maneira, vale por encarar o mito, brincar com Brasília e a juventude (precisamos muito de filmes jovens) e por sacanear o Herbert Vianna – e o Dinho e filhos de diplomatas também.
Faroeste Caboclo é outro papo (pequena resenha para a Rolling Stone aqui). Dirigido por René Sampaio, tem bastante vigor em muitos momentos. Há mais ousadia, mais chute – e não necessariamente mais erros.
O roteiro também é de Bernstein – com Victor Atherino -, porém aqui as situações parecem mais complexas, os personagens ganham tempo na tela para colocar algumas questões.
Fabricio Boliveira e Ísis Valverde estão ótimos. Ela ainda será uma das grandes estrelas dos nossos produtos audiovisuais.
Também como vantagem em relação ao Somos Tão Jovens, há muito mais Brasília aqui. A cidade parece curiosa, ofegante, misteriosa, abusada.
Lembro do último take de Tropa de Elite 2, aquele vôo sobre Brasília, e a comoção da plateia. Foi como um trailer do que pode acontecer se a gente mergulhar nesse epicentro.
Problema: o dinheiro da curtura vem justamente dali.
Esse é o nó de parte da tal indústria cultural brasileira. Ela pertence ao Estado.
Como lembrou o roteirista Mauricio Zacharias – aliás, vejam o bom Keep the Lights On – na Folha: “Com os parlamentares e os escândalos que temos, certamente Brasília renderia ótimas séries. Mas não sei se a TV do Brasil teria coragem de colocar esses personagens no ar”.
Se o audiovisual começar a cutucar mesmo Brasília, muita coisa interessante pode jorrar.

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