O cinema permite que a gente exerça nossas mais estranhas idiossincrasias. Muitas vezes assistimos a um filme por diversos motivos – menos pelo fato de ele ser realmente bom.
Na tela, conseguimos encontrar prazer em lugares nada óbvios.
Lembro da alegria que senti quando descobri que eu poderia ver um longa-metragem só por causa de uma cena ou de um tema.
Quando eu tinha uns seis anos, meu pai um dia comentou que adorava “filme com neve”. Não importava o gênero, o diretor, a qualidade; o que valia para ele era ter neve.
Fiquei com aquilo na cabeça. Eu acompanhava o cinema que era permitido pra mim (animações e censura livre). Então eu gostava de tudo o que eu via. Mas a partir dessa constatação do meu pai (“filmes com neve”), também passei a elencar motivos que me faziam adorar os filmes.
Assim, comecei a ir além da questão do senso comum. Entendi que era possível ter prazer com pequenas coisas de uma obra cinematográfica, sem se importar muito com a qualidade geral do negócio.
Filmes são pródigos em libertar essas idiossincrasias. Podemos ver um longa por causa de uma cena, uma atriz, um diálogo, um tema, uma música, qualquer coisa. Convenhamos, é muito difícil isso acontecer com um livro, por exemplo. A gente lê porque nos interessamos pela história, pelo autor, pelo gênero – há um limite de situações.
O cinema permite tudo. Justamente por ser uma justaposição das artes, consegue sempre nos proporcionar algum vislumbre de prazer nas suas duas horas de projeção (já falei um pouco sobre isso aqui).
Acho que todo mundo tem um top ten de “coisas” que as fazem assistir a um filme – sem contar o hype ou a qualidade da obra.
Há elementos que sempre estão na minha lista. Eu não deixo de ver filmes com:
vilões russos
bomba atômica
cenas em Nova Iorque
adolescente querendo perder a virgindade
mulher pelada
órfão
personagem escritor ou jornalista
destruição total ou parcial do planeta
passado na Idade Média
alienígenas
Outros mudam com o tempo – principalmente atrizes e atores. São volúveis, depende do estado de espírito.
Atualmente, por exemplo, não deixo de ver filmes com a Greta Gerwig. Não sei explicar bem o motivo – e esta é a graça da idiossincrasia, você não precisa ter coerência.
Acho que ela funciona bem em qualquer cena, em todos os gêneros.
Greta acaba de estrear seu mais recente filme, Frances Ha, que fez com seu atual marido, o diretor Noah Baumbach. Não vi, mas já sei que é bom.
Outro dia conferi Lola Versus (2012), de Daryl Wein, só porque tem Greta Gerwig e Nova Iorque (se rolasse um vilão russo seria um filme muito bom). É uma comédia romântica das mais chatinhas, previsível, com coadjuvantes terríveis e nenhuma emoção ou humor. Mas tem Greta Gerwig solando durante uma hora e vinte.
Como escreveu A.O. Scott no New York Times: “não dá para desprezar completamente um filme que tem espaço para Mallarmé e Ms. Gerwig”.
Por isso não consigo sair de um filme, mesmo quando ele já se revelou tenebroso. Sempre acho que algo vai acontecer, que por quatro segundos vou adquirir um novo item para a minha listinha de prazeres secretos.

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