Marc Forster dirigiu talvez o pior filme do 007 – Quantum of Solace. Esse é o tipo de coisa que marca a vida da gente. Não dá pra sair impune, mesmo antes comandando projetos interessantes como Muito Mais Estranho que a Ficção (2006) e Monster’s Ball (2001).
Agora, ele aparece com a complicada produção Guerra Mundial Z, um longa que foi para o mundo dos mortos e voltou graças ao empenho de seu astro, Brad Pitt.
É o típico blockbuster que a gente assiste tenso, esperando o pior. Na hora de pagar o caro ingresso (em 3D o negócio está ficando proibitivo para quem não tem carteirinhas) eu suei frio. Duas horas de ação com zumbis destroçando todo mundo controlados pela perspicácia do cara que rodou O Caçador de Pipas?
Medo. E não é que o filme funciona muito bem? Principalmente na tomada de Jerusalém (fiquei com vontade de rever o injustiçado Cruzada, de Ridley Scott) e no angustiante labirinto num centro médico do País de Gales, Guerra Mundial Z consegue imagens impressionantes e provoca bastante suspense – e até algum terror.
A obra é um Contágio, do Steven Soderbergh, turbinado. O agente especial da ONU interpretado por Brad Pitt é o responsável por encontrar o paciente zero da pandemia mais esquisita da história do planeta.
Tudo acontece porque perdemos o controle do mundo globalizado. Há pessoas demais, doenças demais, trânsito demais, miséria demais, enfim, vivemos constantemente ameaçados pelo excesso.
Uma hora ou outra seremos pegos. Pode ser uma onda gigante, uma multidão gigante, uma manifestação gigante, um cometa gigante, qualquer coisa vai nos atingir. Pode se preparar aí. Não é uma boa coisa para se ler num blog sobre roteiros, mas fazer o quê?
Guerra Mundial Z tem que ser visto. Principalmente por aqui, neste momento em que tentamos diferenciar “baderneiros e vândalos” das “pessoas de bem”.
Como escreveu David Denby nesta excepcional artigo para a New Yorker, nos borramos de medo de zumbis não porque eles são parecidos com a gente; eles são a gente, só que um pouquinho mais zoados. Sentimos aquele mesmo friozinho quando vemos os tais vândalos destruindo orelhões (aliás, eles funcionam?), saqueando lojas e tocando fogo nas ruas. Parece que eles estão possuídos, certo? Mas possuídos pelo quê? Pela raiva?
Esse é o terror. Eles não usam armas, eles não sentem medo, eles não são vivos – agora falo só dos zumbis do filme. Feito um homem-bomba doidão de pó, estão aí apenas para tocar fogo no planeta – e garantir a sobrevivência de suas mortes, claro. Fazem de tudo para continuar vivendo eternamente – mesmo nesse estado catatônico.
Para piorar um pouco, os bichos pensados por Max Brooks, autor do livro de 2006 que deu origem ao filme, são ágeis, se transformam em máquinas de matar em dez segundos e têm alguma inteligência.
O roteiro de Matthew Michael Carnahan (com colaboradores) evidencia o caráter político e alegórico das criaturas selvagens ao colocar ações acontecendo na Coreia do Sul (com explosão nuclear e tudo), Jerusalém, EUA, Índia e pontos representativos da nova ordem mundial.
Creio que nossa aflição venha dessa capacidade que o filme tem de nos jogar num universo muito conhecido – porém mais violento e catártico. Quando os zumbis espalham raiva num avião, impossível não lembrar do Onze de Setembro; a bomba nas Coreias é um alerta óbvio; o comando do mundo fica nas mãos da ONU; a muralha de Jerusalém não separa religiões e crenças, mas sim mortos dos vivos; etc.
(Claro, o universo zumbi é cheio de referências políticas; George Romero é insuperável nisso e corra lá rever Madrugada dos Mortos.)
Além disso, há essa incompreensão diante da velocidade dos fatos. Assim como o planeta, tudo vai rápido demais em Guerra Mundial Z. Não conseguimos fazer uma vacina para algo mortal como não sabemos agir diante do povo nas ruas, gritando por melhorias. A turma foi pega de surpresa. E esses zumbis são os verdadeiros velozes e furiosos.
Pena que o Brad Pitt cancelou sua visita ao Brasil. Uma cena da continuação de Guerra Mundial Z tem que acontecer por aqui (ou já aconteceu, certas imagens da quebradeira no Rio de Janeiro, por exemplo, mostradas no Jornal Nacional, poderiam ilustrar o longa).
Para tudo virar um caos, basta uma tosse, um vento, um vírus, uma palavra de ordem ou a luta por R$ 0,20. Pensamos na nossa fragilidade 24 horas por dia. As coisas não estão nada fáceis. Mesmo quando tudo parecia bem, num segundo nos percebemos zumbis. Dá medo.

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