2014: Começamos bem

Stacy-Martin-is-a-Nymphomaniac

Se alguém ainda acha que o cinema não tem mais nada pra dizer, recomendo um pulo em qualquer multiplex “de arte”. Estão em cartaz discussões sobre o amor, a sexualidade, a beleza desgastada de Roma e o poder do dinheiro.

A programação anda tão exuberante e provocante que numa mesma sala exibem Frozen, às 14h, e Ninfomaníaca – Volume 1, às 16h30. É um espetáculo observar a criançada faceira saindo de mais uma aventura no mundo Disney e encontrando uma fila de marmanjos doidos para entrar no universo de Lars Von Trier (uma espécie de Walt Disney de um mundo angustiante, perverso, mas também muito divertido).

Não resisto ao exercício. Pego os horários do Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca apenas de três salas e vejo o doce problema que é escolher um filme pra hoje. Isso se conseguir sair de casa, já que a TV norte-americana inventou de caprichar na temporada de inverno deles. Como não ver True Detective, da HBO? Ou a nova temporada de Girls (os dois primeiros foram capengas)? Ou a estreia da boa comédia Enlisted?

Mas o cinema nos chama com bastante energia nos dias de hoje. Ótima notícia: há espaço para todos.

Pois bem, na sala 1 do Espaço temos Frozen para a molecada e Ninfomaníaca – Volume 1 para os descolados. Talvez este seja um dos ótimos filmes do dinamarquês mais marqueteiro do cinema. As histórias da delicada Joe soam divertidíssimas, irônicas (menos naquele terrivelmente belo episódio em PB no hospital psiquiátrico) e feministas. A figura do comentarista é genialmente absurda e lotada de farpas aos críticos. Mas talvez o melhor mesmo seja esse planeta anacrônico, com seu sexo coreografado e angústias existenciais, criado por Von Trier. Que lugar de nosso cérebro é esse?

Na sala 2 aparece A Grande Beleza, de Paolo Sorrentino. Acho que o meu preferido dessa nova safra. Na verdade, mais empolgante do que qualquer um desses saudados por exibir nudez, sexo e drogas. Há um pensamento sobre o cinema, movimento de câmera, lentes, fotografia e atuações. Seus planos são inesquecíveis, seus personagens arrebatadores e sua linguagem brilhante. Aquele passeio final pelas glórias e fracassos da civilização ocidental me fez chorar compulsivamente. Como conseguimos ser tão geniais e bestiais ao mesmo tempo?

O Lobo de Wall Street está na sala 3. Tenho algumas dúvidas sobre a narrativa (não entendo muito aquele lance do Leonardo olhar pra câmera e certas relações entre os personagens), mas Scorsese mostra novamente uma energia brutal para contar uma história. E Leonardo Di Caprio atinge o auge, mergulhando de vez num excesso que só parece caber em Joaquin Phoenix e Philip Seymour Hoffman. Suas cenas com Mattew McCougney e Jonah Hill são memoráveis. Aliás, a sequência em que ele e Hill se drogam e perdem a coordenação motora deve virar um clássico. Também chama a atenção como Scorsese encena tudo sem pudor, deixando a moçada cheirar pra valer.

Na mesma sala, o lobo alterna horário com o bonito Pelos Olhos de Maisie, um relato de cortar o coração sobre uma menina “abandonada” pelos pais. Um interessante exercício de aproximação do olhar de uma criança que vira alvo da disputa num conturbado divórcio. A interpretação da garota Onata Aprile é uma daquelas que não conseguimos compreender. Como será que fazem isso? Há um custo na formação moral e psicológica dessa atriz ou isso é apenas tremendamente humano?

Ainda há coisas interessantíssimas nos outros lugares, como o último do Coppola, o japonês Pais e Filhos, Álbum de Família e Alabama Monroe.

O Brasil colabora. Apesar de nulidades como Muita Calma Nessa Hora 2, há Confissões de Adolescente, que tem arrancado excelentes críticas para o sensível – e engraçado – texto de Mateus Souza.

Que fase. Um bom ano começa.

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