Críticos, por favor, escrevam mais sobre séries de TV

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Uma vez por mês, A Folha de S.Paulo publica um suplemento cultural chamado Guia Folha – Discos, Livros e Filmes, uma espécie de revistinha só com resenhas. O plantel de críticos é diversificado, com jornalistas, professores, profissionais das áreas abordadas etc.

O material é interessante pois mostra como um veículo mainstream tenta se aproximar da “alta cultura”. Naquelas páginas, a turma pode discutir, sem nenhuma vergonha, Freud, Nietzsche, autores de sambas obscuros e lançamentos de DVDs clássicos.

Ao mesmo tempo, a publicação é um reflexo de como a crítica das maiores publicações brasileiras trata as séries de TV: com um completo silêncio.

Poucas vezes as páginas do Guia abordaram os boxes com as temporadas completas de verdadeiras revoluções dramatúrgicas, como Breaking Bad ou Mad Men (ok, não está no título do caderninho, mas é só colocar um “TV” ali no final; e outra, episódios hoje são minifilmes e uma temporada é um filmão).

Por quê? Acham que de fato esse método de contar histórias é parecido com uma música do Tiririca e não presta para estar ao lado do novo DVD do Spielberg? Ou então não sabem como abordar as séries? Ou não têm capacidade para isso? Faltam profissionais?

Se os jornalões e revistas quiserem formar leitores e realmente prestar um serviço, não dá mais para deixar de abordar com seriedade as estruturas dos seriados norte-americanos (e brasileiros, claro).

Ah, mas sempre estão falando disso”… Claro, invariavelmente escrevem contando fofocas do elenco, audiência dos episódios, spoilers da trama etc. Mas raramente observam o conteúdo e a forma.

Recentemente, o crítico Matt Zoller Seitz causou furor entre seus pares divulgando um manifesto pedindo para que as resenhas passassem a abordar mais a direção (ou seja, as imagens) e menos a história e os personagens.

O artigo é provocativo, interessante, coerente e merece ser lido (aqui).

Na sequência, a crítica de TV da New Yorker, Emily Nussbaum, rebateu alguns pontos e concordou com muitos outros, entrando no debate e esmiuçando as características de uma boa análise de um programa televisivo (às vezes, a forma é simples, mas o conteúdo absurdamente complexo).

O texto dela (aqui) é uma pequena aula para todos aqueles que pretendem um dia escrever sobre o que move um seriado.

Nem vale a pena comparar o nosso mercado de “críticos de TV” com o norte-americano. Além deles possuírem uma imensa rede de articulistas amadores, que fazem seus recaps e montam consistentes estudos na internet, a mídia tradicional abre espaço para profundas discussões (basta ver o frisson que rolou com True Detective).

Para ficarmos apenas no exemplo da Folha de S.Paulo, o destaque maior para esse tipo de narrativa acontece somente aos domingos, quando há uma coluna fixa sobre séries, comandada por Luciana Coelho, e um espaço dominado por Maurício Stycer (mas que transita entre programas de TV, séries, jornalismo televisivo e BBB).

Muito, muito pouco para tudo o que está acontecendo nesse mercado (me parece que Estadão e O Globo seguem essa mesma toada, não?).

Essa interlocução precisa começar a acontecer com mais firmeza e propriedade no Brasil.

Uma série do porte de Psi, da HBO, escrita por Contardo Calligaris e Thiago Dottori, por exemplo, merece melhores análises para compreendermos (público, roteiristas e produtores) como está funcionando o projeto brasileiro de séries de TV.

Há uma lei que força a entrada de milhares de pessoas nesse mercado. Os produtos estão aparecendo, mas parecem cair num limbo de repercussão.

Mesmo aquelas (a maioria, infelizmente) que são uma tremenda porcaria, precisariam ser pensadas e discutidas por um público maior.

Já tratamentos que deixam claro seus projetos, como Psi e Sessão de Terapia, merecem atenção para encontrarmos erros e acertos.

Por que os críticos de cinema não olham para as séries, por exemplo? Talvez eles pudessem ser os primeiros a publicar artigos e pensamentos unindo forma e conteúdo sobre o que está acontecendo na dramaturgia brasileira nessa área.

 

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