Como ser roteirista

writers_room_unit_american_horror_01

O crítico de TV e cinema Matt Zoller Seitz publicou em seu blog um decálogo sobre como ser crítico. É mais uma de suas peças bem escritas, sucintas e com ótimas referências. Você pode ler as dicas dele aqui.

Ora, bolas, pois são exatamente os mesmos tópicos iniciais que eu indicaria para quem pretende começar a escrever roteiros. Faz todo o sentido, não? Afinal, críticos e artistas trabalham para mostrar que seus pontos de vista sobre determinado assunto são os mais interessantes.

Adaptando um pouquinho o texto do Matt Zoller, minha brincadeira ficaria assim:

Assista a muitas séries e filmes. Fico impressionado quando leio entrevistas com diretores brasileiros e eles não conseguem citar um filme, uma série. Não dá pra ser o Scorsese, que é capaz de ficar sete horas falando sobre um fundamental filme de gângster do início do século passado, mas se você quer fazer um bom trabalho no audiovisual, tem que ser um maníaco pelo audiovisual. Ver de tudo um pouco e mergulhar fundo nas suas preferências. Pelo menos um filme por dia (ou dois episódios de alguma série).

Aprenda sobre a história do cinema e da TV. Neste ponto temos que correr atrás. Infelizmente não temos um bom histórico educacional na área de roteiros. Mas é fundamental saber sobre os movimentos cinematográficos, os grandes diretores, roteiristas e a arte narrativa da TV. Ter essas referências facilitam na hora de contar a sua história. E você vai gostar muito. É divertido.

Escreva pelo menos duas horas por dia, mesmo que você não vá produzir esses roteiros. As dúvidas, os problemas, as soluções, enfim, seu roteiro só aparece de fato quando as palavras começam a ser jogadas no papel (tela do computador, do celular, sei lá). Todos os dias alguém aparece com uma super ideia de uma série maravilhosa. Apenas 3% desses incríveis conceitos são de fato escritos e viram alguma coisa. Por quê? Muitos roteiristas iniciantes acreditam na Fada do Computador, naquela pessoa bondosa que vai transformar seus pensamentos em um projeto. Isso não existe. Dá um trabalho desgraçado escrever uma boa cena (uma!). Erre, jogue tudo fora, guarde parte na gaveta, mas faça. E leia em voz alta seu texto. Todos eles.

Tome nota de suas ideias. Pare tudo o que estiver fazendo e anote aquela frase interessante, uma face curiosa que viu no metrô, uma palavra engraçada, um jeito de andar, uma expressão, uma história, tudo. Só o Truman Capote não precisava anotar as coisas. Você precisa. Ou vai esquecer. Crie um arquivo e jogue tudo lá. É um excelente material. Eu chamo de “pronto-socorro”. Pode te ajudar quando você simplesmente não souber como continuar.

Torne a vida do seu leitor mais fácil, não mais difícil. Escreva com precisão, charme, clareza e sempre respeitando o formato. Baixe o Celtx ou algum programa para roteiristas. Nunca mais escreva um roteiro no Word sem formatação. Lembre-se que seu roteiro será lido por produtores, atores, diretores, sua mãe e… você não estará lá para explicar a história ou como visualiza cada sequência. Repetindo: precisão e clareza (se conseguir o charme, melhor ainda). E, por favor, sem erros gramaticais ou de ortografia. Se seu material não apresentar erros, já pula para a – pequena – pilha dos bons textos.

Leia sobre história e psicologia. Acho esse tópico maravilhoso. Você é um narrador, precisa entender de narrativa. Leia biografias, literatura de não ficção e estudos sobre comportamento. Um livro do Oliver Sacks te oferece mais sugestões de personalidades e personagens do que você pode imaginar. Eu recomendaria tudo sobre neurociência. Corra atrás de personagens. Veja as notícias, acompanhe os jornais. Você está escrevendo sobre a história de pessoas que estão no mundo (qualquer um). Ah, segredo: livros de contos são incríveis estimulantes.

Cuidado com as influências. Não fique preso a um determinado estilo ou autor se você sentir que isso está sufocando o seu trabalho. Lembre-se que você também é um autor com voz própria.

Troquei esse tópico por: leia roteiros! Parabéns, você vive numa época em que num clique consegue acessar milhares de roteiros. Sim, aquelas coisas que antes ficavam apenas nas mãos de uns poucos escolhidos, agora podem ser visualizadas e compreendidas por você. Procure os clássicos do cinema e também as novas séries da TV. Só assim você poderá observar textos sublimes como os do Vince Gilligan, por exemplo. Vejam que trecho de Breaking Bad:

This town has a kind of Old West feel. It might put us in mind of the opening to “The Wild Bunch.” All is quiet. No activity of note. Not until…

… An OLD MEXICAN MAN comes crawling on his belly.

What a face. If Fellini were alive and directing spaghetti westerns, this is a face he’d cast. With skin tanned to the hue of a well-oiled catcher’s mitt and wrinkles deep enough to hide M&Ms, this man is somewhere between seventy and three hundred years old. Here he comes, making his way on knees and elbows padded with a filthy swaddling of tied-on RAGS.”

Apenas escreva, pô! Aqui o Matt já disse tudo.

10 Seja o melhor que puder. E passe seu trabalho para as pessoas que você confia. Discuta seus textos, entenda o que funciona e o que você deve jogar fora. Brigue por eles.

2 comentários em “Como ser roteirista

Adicione o seu

Deixe um comentário

Blog no WordPress.com.

Acima ↑