Acho que já dá pra cravar que Mad Men teve a meia temporada final mais bem escrita dos últimos anos. Os sete episódios da sétima e derradeira fase foram todos primorosos – e alguns, de fato, brilhantes.
O criador, showrunner e roteirista Matthew Weiner abusou da elegância e até cometeu aquele ousado e delicioso número musical final. Aí é covardia. Lá vamos nós esperar até a próxima primavera (lá nos EUA) para entender o que Don Draper estava pensando no momento em que viu o falecido Bert Cooper dançando com as cocotas.
Mas nem adianta guardar luto porque Louie está no meio da quarta temporada e arrebentando.
O criador, showrunner, roteirista, diretor, editor e ator Louis C.K. entrega toda semana uma das séries mais cinematograficamente inventivas da temporada (e não é por falta de concorrência).
E pensar que a base de tudo é a fala, pois se trata da rotina de um comediante stand-up. Nada disso. A quantidade de piadas visuais e experiências com as imagens estão transformando C.K. num autor digno de estampar a capa da Cahiers du Cinéma.
Será o melhor diretor de série da TV hoje?
Nesse artigo conto um pouco do que rolou na última temporada e aqui é possível ler uma boa entrevista com o mestre.
Sobre esta nova leva de episódios, Forrest Wickman traça na Slate um perfil dos planos-sequências de Louie e por que a série está abafando quando o assunto é direção.
Abaixo, dez sequências dos primeiros oito episódios dirigidos por C.K. que merecem o Oscar, Emmy e Kikito.
EP 1 – BACK
A primeira sequência da volta de Louie é a perfeita carta de intenções dessa temporada. Louie dorme embalado por um jazz, mas logo seu sonho vira pesadelo ao ter seu quarto invadido por lixeiros. Uma cena surpreendente e engraçada, capaz de dar conta da doce agonia que é sair da cama todos os dias (não adianta fingir que não é com você, a vida arrebenta a janela e entra com tudo). E que linda edição, deixando tempo para a gente curtir a brincadeira dos lixeiros.
EP 2 – MODEL
Provavelmente deve terminar no top 5 dessa temporada. Há boas cenas espalhadas por todos os cantos e a participação de Seinfeld. Mas o grande momento cinematográfico é quando o comediante sai da frustrada apresentação para os ricaços. Sozinho no estacionamento, vemos ao fundo a mansão e a figura de um mulher. Jogando com a profundidade de campo, Louie (primeiro plano) conversa aos berros com Blake (Yvonne Strahovski; fundo do plano). Sem cortes, a garota pega o carro e se aproxima da câmera/Louie. Sacamos que nosso anti-heroi terá finalmente uma noite gloriosa.
Neste mesmo episódio, uma sequência melancólica, mas cheia de ternura. Louie vê Blake tirar a roupa e se jogar no mar. Está escuro, o lugar é lindo, a vida parece ser uma dádiva. Ele apenas observa a juventude se divertindo no meio das ondas. Um sonho que, logo mais, vai se tornar drama (situação sempre bem explorada por C.K.: a interrupção do sonho).
EP 3 – SO DID THE FAT LADY
Esse deve estar no top 3. O enorme plano-sequência com a conversa entre Louie e Vanessa (Sarah Baker) sobre as mulheres gordas já causou polêmica, intrigas e discussões. C.K. fez um pequeno curta homenageando a trilogia Before de Richard Linklater, Ethan Hawke e Julie Delpy.
EP 4 – ELEVATOR: PART 1
A filha mais nova de Louie na série, Jane (Ursula Parker), ganhou um justificado protagonismo nos últimos episódios. Todo o trecho em que ela acha que está num sonho (tema recorrente em muitas cenas, como se o surreal comandasse a temporada) é cheio de suspense, cortes rápidos e tensão.
EP 5 – ELEVATOR: PART 2
Talvez aqui Louie tenha feito as imagens definitivas de uma comédia romântica em Nova Iorque. Seu passeio com Amia (Eszter Balint) pelos highlights da cidade é o melhor comercial do lugar em anos. Tudo no espaço certo, com a presença da Estátua da Liberdade, das águas, do parque e das compras (absurdamente doce e sexy o término na mímica).
EP 6 – ELEVATOR: PART 3
Mais uma cena em que música e imagens contam toda a história. Jane e Amia (essas lindas almas gêmeas) se encontram e não precisam do inglês para se comunicarem. Basta dois violinos. Vai tomar banho, que coisa delicada!
EP 7 – ELEVATOR: PART 4
Pra mim, até agora a cena mais sensível e eficiente da série. Num plano-sequência, Louie nos mostra a rotina de sua casa. Há pessoas jogando xadrez, tomando vinho, ensaiando, cozinhando… Existe um imenso conforto nessas imagens (apesar de banais). Pois é esse o olhar da série e o que o cinema busca alcançar: transmitir sentimento. E ele consegue isso com a exatidão dos gestos e a elegância do plano sem cortes (com aquela mão no ombro que arrepia qualquer um).
Neste mesmo episódio, Louie comete uma hilária digressão no consultório da terapeuta, quando vai para a janela gritar.
EP 8 – ELEVATOR: PART 5
Toda a rotina do amigo de Louie narrada como se fosse um pequeno curta chamado A Vida de Todd Berry. Mais uma inevitável e charmosa interrupção na história para demonstrar a força narrativa de C.K.
