Sobre macacos e robôs: apontamentos para futuros textos

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PLANETA DOS MACACOS: O CONFRONTO

Um filme que dedica tanto tempo mostrando o quanto Black Hole, os fantásticos quadrinhos de Charles Burns, é precioso, não pode ser ruim. Esse tipo de tecido dramático (colocar um adolescente e um primata lendo juntos um livro) arrasa a crítica que apenas menciona os efeitos especiais, a violência ou qualquer outra coisa que encontram para detonar o longa (alguém aqui, acho que na Folha, até mesmo escreveu que os efeitos estão destruindo o cinema – oi?).

Matt Reeves consegue deixar tudo redondinho e usa lentes capazes de registrar grande parte das ações num único quadro. É um filme abertíssimo, de paisagens, como aquele A Coroação de Napoleão, o quadro de Jacques-Louis David. Sempre muita gente em cena. Uma beleza em tempos de cortes, rapidez e direção frenética.

Reeves fez Cloverfield e homenageou o antigo Planeta dos Macacos naquela sequência em que a Estátua da Liberdade é decapitada. E agora ele dirige um Planeta e injeta coisas de Cloverfield, como nas cenas nos túneis do metrô. Nerds são legais.

Andy Serkis é realmente um fenômeno. Seu Caesar tem uma força brutal e exala poder (e confiança, eu votaria nele). Oscar para o sujeito e não se fala mais nisso. E vale assistir O Congresso Futurista, de Ari Folman, excelente trabalho (bem biruta, na real) que trata sobre esse negócio de captar a emoção dos atores e transformar as imagens em alguma coisa dramática.

O roteiro de Mark Bomback, Rick Jaffa e Amanda Silver arma direitinho a ação nos primeiros 30 minutos. Consegue com clareza e emoção levar várias linhas narrativas (há núcleos para macaco bom, macaco malvado, homem bom, homem malvado) e deixar espaço para apenas duas sequências de ação (nem tão longas assim). Tudo isso recheia o filme com pelo menos uma hora de tramas políticas e desenvolvimento de personagens.

Como não ficar impressionado com o universo criado? O filme anterior da franquia tinha me incomodado (não gostei mesmo) devido a diversas banalidades e situações previsíveis, além de ser insuportável ver a destruição de cidades famosas ou vírus sendo criados em laboratórios por vilões babacas. Aqui não existe nada disso. Grande vantagem.

Apesar de se perder um tanto nos últimos 20 minutos (justamente para dar conta dos vários núcleos), o final é ótimo, deixando um gancho espetacular. Na boa, vou ver o próximo.

E pode escolher qualquer metáfora que quiser. Qual povo é representando pelos macacos, sem armas de fogo, mas com a energia que pode salvar a humanidade em suas terras? E aquele enclave no meio de San Francisco, que de repente vira uma Faixa de Gaza? Tudo se articula e, quando achamos a metáfora perfeita, os dramas mudam de lado. Temos que repensar nossas certezas todos os momentos. Gostei disso aqui que Paulo Cavalcanti escreveu (é isso mesmo, um filme sério).

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TRANSFORMERS: A ERA DA EXTINÇÃO

O título é uma mentira: as desgraças dos robôs não acabam, não. Ninguém é extinto na quarta parte da franquia de Michael Bay. Escrito pelo Ehren Kruger. Escrito? Não sei como é um roteiro desses filmes. Curiosidade. Será que é: “robôs brigam”. E lá vamos para 20 minutos de cenas? Queria ter acesso a essas páginas.

Todo mundo foi mandado embora porque o elenco mudou. Ganhamos alguma coisa. Mark Wahlberg consegue imprimir humor e canastrice no viúvo pai da patricinha (falamos mais depois). Stanley Tucci é sempre divertido (ainda mais xavecando uma chinesa que tem MBA e luta artes marciais). E tem John Goodman e Ken Watanabe. Eles são ótimos. Será que vão fazer as Tartarugas Ninjas? A gostosinha da vez é Nicola Peltz e… Bom, coitada. Pelo menos tiram sarro. O que as feministas devem falar dessas coisas? Ei, agora que percebo que não temos robôs mulheres. Por quê? Mas o melhor de todos do elenco: T.J. Miller como Lucas. Pra mim, o filme termina quando ele morre (spoiler! Droga, avisei tarde demais, mas quem se importa?). Ele é o Erlich em Silicon Valley e vou dizer, é muito engraçado.

Absurdamente tenho que escrever que a primeira meia hora é bem divertida. Bay imprime cor, cria o mundo, não é bobo. Faz seus movimentos de câmera e abre o espaço para a paisagem texana. Também coloca muitas piadas e faz uma manobra sensacional: o caminhão no cinema! Grande cena. Aí temos família e parece que estaremos no ambiente maluco de Pain & Gain, um filme interessantíssimo dele (eu sei, que coisa mais paradoxal) que passou despercebido. Mas logo a pancadaria começa e temos um repeteco interminável de tudo que a gente já viu.

Impressionante o desrespeito com qualquer esboço de dramaturgia depois de uma hora de show. As ações não se completam, nada rima com nada, o dia vira noite e pumba. As cenas ocorrem de maneira desorganizada. O fiapo é simples: todo mundo atrás de uma semente. Tipo corrida maluca. Mas que saco. Michael Bay já fez melhor imagens aéreas na terceira parte (aquele voo sobre Chicago é muito bom) e o resto… Tem um lance Noé na arca dos bandidos (que são uns idiotas). No fim, todo mundo é idiota. Talvez essa seja a grande sacada.

Curiosamente há um mundo ali. Um filme onde os terroristas, mercenários e heróis são robôs. Nada que é humano parece interessar.

Diferente e bacana é a briga nas ruas de Hong Kong. Parece que Bay faz tudo só pra ficar curtindo (interminavelmente, é verdade) esses momentos.

Eis um sujeito estranho, o Bay.

Uso do som. Tudo é artificial. Nenhuma ligação com nada, com o som da rua, do mundo. Chega ao cúmulo de deixar uma música com letra, como um musical, um clipe. Michael Bay deve amar musicais.

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