“The Leftovers” e as séries deixadas para trás

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Toda semana eu checo meu caderninho para ver como ando com as séries. Verifico se estou em dia com as minhas favoritas e qual eu preciso resgatar do limbo – caso eu ganhe umas horas extras de folga na semana.

Nas entressafras (sem episódios inéditos de Mad Men, Louie, Hannibal, Broad City, Veep, Game of Thrones, True Detective, Sherlock e mais uma dezena), consigo diminuir um pouco a avantajada lista daqueles títulos deixados para trás.

Geralmente são séries que vi apenas um episódio (muitas vezes somente o piloto), apenas para entender o ritmo e captar as linhas gerais da trama. Vamos dizer que faz parte da minha ocupação, como um profissional da saúde que precisa se atualizar lendo sobre as novas descobertas da medicina.

Mas há um canto que guarda aquelas que eu comecei a acompanhar e, por motivos muitas vezes insondáveis, abandonei. Pode ser porque não me interessei ou então faltou tempo. Na maioria desses casos, deixei pra lá depois de três episódios.

Existem também situações bem peculiares, como é o caso de Walking Dead. Ainda não entendi bem o que acontece, mas vi exatamente a metade de cada uma das temporadas (sempre a primeira metade). Eu vibro com zumbis sendo destroçados, mas algo me impede de chegar ao final.

Também um treco estranho rola com as produções originais do Netflix. Parei todas na metade (só terminei a primeira de House of Cards). E acho a segunda de Orange Is the New Black muito interessante, com alguns capítulos primorosos. Mas creio que essa sensação de sufocamento (tudo lançado ao mesmo tempo) faz com que eu justamente evite o binge-watching – já que está tudo ali para sempre, posso ver quando eu tiver um tempinho, não há urgência.

Voltando aos casos mais comuns, é uma alegria revisitar uma daquelas séries abandonadas e descobrir que você acaba de encontrar seu mais novo xodó (e melhor, pode ver vários episódios na sequência).

Isso me aconteceu com The Leftovers. Criada por Damon Lindelof e Tom Perrotta, é baseada no livro deste último e narra o cotidiano de uma cidadezinha norte-americana três anos depois do arrebatamento, quando 2% da população mundial desapareceram do mapa (uma entrevista com Perrotta aqui).

Eu tinha conferido os dois primeiros episódios e, um pouco decepcionado por não saber quem seguir, deixei The Leftovers para trás.

Quando o oitavo capítulo passou na HBO norte-americana, resolvi dar uma nova chance para a história e encarei finalmente o terceiro. Foi a minha perdição.

É um episódio centrado num pregador, interpretado magistralmente por Christopher Eccleston, que precisa angariar fundos ou irá perder a sua igreja. Não há subtramas. Apenas esse enredo, como se logo no terceiro episódio a série parasse para respirar e resolvesse dar um descanso para o protagonista (aparentemente o policial feito por Justin Theroux).

Pois bem, as sequências foram tão cativantes e bizarras – e a história bem contada – que não vi a hora de encarar a próxima surpresa. E ela veio.

A cada minuto The Leftovers se reinventa, usando flashbacks, esmiuçando a vida de um determinado personagem ou lançando efetivos ganchos emocionais (seja com violência ou com romance). É impossível prever o que vai acontecer na próxima semana. Vão continuar com aquele personagem ou passar a contar a história do roubo de um menino Jesus de brinquedo? E as seitas e cultos criados para aliviarem a dor das pessoas? Vamos saber mais delas quando?

Parece que Lindelof e Perrotta escolheram um tema para ligar tudo (e não personagens ou tramas). É o luto que nos move a assistir The Leftovers. Apesar da premissa fantástica, o que encanta é a discussão sobre como viver sem as pessoas queridas. Ou mesmo como conviver com o mistério da morte.

Em todas as sequências temos a presença do desconhecido. Afinal, se há pouco tempo centos e tantos milhões de seres sumiram sem avisar, por que isso não pode acontecer de novo exatamente agora?

O imprevisível contamina tudo e nos deixa num eterno suspense. A direção impecável consegue patrocinar com sucesso esse sentimento, fabricando cenas estupendas, detalhistas e contemplativas.

Há um sem número de sequências marcantes, carregadas de um apuro visual difícil de se encontrar por aí (mais sobre essa sensação neste artigo de Emily Nussbaum).

A HBO garantiu uma segunda fornada de episódios da série. Ainda bem. Por enquanto, não dá para deixar The Leftovers.

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