O último episódio da atual safra da série A Grande Família é um dos melhores produtos audiovisuais produzidos no Brasil este ano (e aí também estou contabilizando os filmes).
Deve ter sido o episódio mais bem escrito de uma série nacional de 2014. Metalinguístico, esperto, com atuações extraordinárias e engraçado, a despedida do título foi um sucesso.
Faço aqui coro ao que Cristina Padiglione escreveu no Estadão: bem que poderiam publicar (ou jogar na rede) esse roteiro.
Eu sei que a televisão norte-americana assiste a esse tipo de competência de hora em hora. Mas isso não significa que devemos nos calar quando atingimos esse nível de excelência.
O texto e as ideias desse episódio poderiam ser compartilhados. É muito difícil encontrar por aí exemplos de uma meia hora tão bem amarradinha. Já que pretendemos, um dia, ter uma indústria de séries sadia e vibrante, precisamos olhar para quem faz a coisa certa.
Além do ritmo e qualidade habituais, os roteiristas se destacaram por três situações:
• A metalinguagem funcionou perfeitamente. Fazer uma “série da série” provocou alvoroço nas redes sociais (teve gente que não entendeu) e mostrou que um pouco de ousadia traz diversidade e comicidade. Explorar novas narrativas pode ser uma boa. Esse episódio ecoa o sucesso do programa Tá no Ar, que também brincou com o formato. Esse conceito pode ganhar fôlego na dramaturgia e produzir trabalhos mais inovadores.
• Ao assumir personagens reais (Daniel Filho, Tony Ramos, Lázaro Ramos etc.), a Globo também apareceu na tela como… Globo. O grande acerto foi não apenas aproveitar a oportunidade e fazer um comercial disfarçado (e muitas vezes isso aconteceu), mas também provocar uma oportuna autocrítica. A figura de Daniel Filho invadindo a pacata vida dos Silva é violenta e desesperada. Ele precisa de um sucesso, ele precisa de humor, ele precisa entender o que o povo quer. O recado é claro: a Globo simplesmente ainda não conseguiu retratar a nova família brasileira, esse núcleo tão estudado e modificado nos últimos 12 anos (não à toa essa fase da série durou 14 anos). Por isso, A Grande Família precisa se reinventar, encontrar novos atores (com um negro agora na mesa, na figura de Lázaro Ramos), temas e diálogos. O Brasil mudou e a Globo corre atrás do prejuízo. Precisa urgentemente de seu Modern Family.
• Foi uma avalanche de bons atores e atrizes. Estavam ali pelo menos 20 grandes artistas, com um perfeito domínio da profissão. Muitos eternamente presos a personagens ruins de novelas ruins. Que bom se pudessem – e quisessem – ser mais livres e passeassem mais por outros lugares e encontrassem bons textos.
Foi a segunda morte da série. Mas, como os roteiristas deixaram claro, haverá outras. A Globo não vai desistir de procurar entender os Silva.
Aqui você assiste ao episódio completo.

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