Steven Spielberg é um dos maiores contadores de histórias dos últimos 50 anos. Não somente do cinema. Ele é um narrador tão potente quanto Philip Roth, Bob Dylan, a bielorussa que acabou de ganhar o Nobel, Gay Talese, Matthew Weiner, Tarantino e pode selecionar aqueles seus 20, 30 autores vivos favoritos.
O que ele faz nos primeiros dez minutos de seu novo filme, Ponte dos Espiões, nos deixa completamente arrebatados. Sem nenhum diálogo, Spielberg desvenda a essência da rotina espartana e meticulosa de um espião. Um espetáculo de planos, ritmo e elegância. A tela inicial, com os diferentes quadros, deve ser um dos melhores inícios da década.
Dividido entre Estados Unidos e Alemanha, o filme conta a história do advogado James B. Donovan (Tom Hanks), que em 1957 defendeu o espião russo Rudolf Abel (Mark Rylance), capturado em solo norte-americano e levado a julgamento.
A primeira parte é quase uma continuação de Lincoln, com suas aulas sobre a constituição dos EUA e os diversos significados do que é ser norte-americano (com impressionantes pontes para os dias atuais). A segunda, que acontece em Berlim, quando Donovan patrocina uma troca de presos políticos durante a Guerra Fria, carrega no suspense e estabelece uma deslumbrante sequência de tensão.
Não somente as imagens são emblemáticas e potentes (ponte, trem, Berlim ocupada, acidente aéreo); os diálogos lapidados pelos irmãos Coen (o roteiro original é de Matt Charman) merecem aplausos de pé pela rara capacidade de sucintamente dizerem tudo.
Tom Hanks e Mark Rylance (que ator extraordinário) foram feitos um para o outro, cúmplices absolutos para demonstrarem o tema do filme: a resiliência.
Em três links, pequenas lições de Spielberg:
• Nessa entrevista para o New York Times, ele fala sobre seu processo de criação de histórias, Homeland e produções dos anos 40.
• Para o Eduardo Graça, do Globo, Spielberg e Tom Hanks explicam por que os diálogos do filme são espetaculares.
• Na Rolling Stone, um ranking de seus filmes.
*
Nessa altura você já sabe que Perdido em Marte é uma das boas coisas do ano. Fomos abençoados com um filme divertido sobre alguém abandonado no espaço. O astronauta e biólogo Mark Watney (Matt Damon) quer sobreviver porque é isso que fazemos todos os dias. Não planta batatas em Marte para voltar pra família ou dar água para o cachorro. Ele quer simplesmente se mandar de um planeta vazio, chato e sem muita coisa para fazer (o fato dele estar com uma sentença de morte se ficar por ali ajuda, claro).
Alguém escreveu por aí que essa é a melhor sequência possível de Alien, uma das três ou quatro obras-primas do Ridley Scott. A vitalidade desse barbudo de 77 anos é impressionante. Ele acabou de lançar Êxodo – aliás, sucesso no Brasil que antecipou esse lance de amor em relação aos Dez Mandamentos da Record – e com Perdido em Marte se consagra nas bilheterias dos Estados Unidos.
Baseado no ótimo livro de Andy Weir, o roteiro de Drew Goddard (que deveria dirigir o filme, mas saiu na hora H) funciona perfeitamente. Uns bobocas falaram que ele apresenta muitos obstáculos. Besteira. O filme traz o que eu gostaria de escrever: fulano precisa atingir um objetivo e enfrenta diversas barreiras, uma mais complicada que a outra. Vai quebrando uma por uma. Porém novas aparecem em consequência às vezes do seu sucesso. E assim vai.
É como um sujeito que precisa quebrar um muro para aumentar a casa. Ele quebra a primeira parte e descobre um ninho de aranhas. Tem que comprar veneno para aranhas. Mata as aranhas, mas aí o cachorro também morre por causa do veneno. Sem cachorro, ele é assaltado. O muro é o pretexto para entendermos melhor aquele homem. No final, ele vai aprender diversas coisas graças a esses obstáculos originados pelo muro. O que importa são os problemas. A solução final é o brinde.
Mas esqueçam tudo isso e leiam essa entrevista com o Drew Goddard. Bom, o cara escreveu com o Joss Whedon The Cabin in the Woods, uma das coisas mais legais pra gente assistir bêbado. Ótimas lições.
*
Não importa se essa entrevista com o Aaron Sorkin está salpicada de spoilers. Ele explica (mesmo) como escreveu Steve Jobs, espécie de biografia “de você sabe quem” dirigida pelo Danny Boyle.
É quase um cursinho sobre como escrever um longa.

Deixe um comentário