Livraço na área. A Companhia das Letras acaba de lançar As Entrevistas da Paris Review (tradução de Christian Schwartz e Sérgio Alcides).
É o primeiro volume que compila entrevistas publicadas na célebre revista literária americana.
São 14 conversas com escritores/roteiristas que contam sobre seus trabalhos, o processo criativo, convivência com seus pares etc.
As páginas dedicadas ao diretor Billy Wilder são preciosas e engraçadíssimas.
É o relato de uma conversa realizada em 1996. Alguns trechos:
FRACASSO
Claro, cometi erros, meu Deus. Às vezes, quando acontece um grande fracasso, o pessoal diz: “Era um filme à frente do seu tempo. O público não estava preparado”. Besteira. Se o filme é bom, é bom. Se é ruim, é ruim.
BOGART
Em Sabrina, sofri um bocado com Humphrey Bogart. Era a primeira vez que ele trabalhava para a Paramount. Toda noite, depois das filmagens, o pessoal vinha até meu escritório beber alguma coisa, e esqueci de convidá-lo uma ou duas vezes. Ficou possesso e nunca mais me perdoou.
CAPRA
Às vezes, quando se termina um filme, simplesmente não se consegue saber se ficou bom ou ruim. Quando Frank Capra filmou Aconteceu Naquela Noite com Claudette Colbert, terminada a última tomada, ela disse: “Acabou, senhor Capra?”. “Sim, terminamos.” “Certo. Então por que agora o senhor não vai se foder?” Ela achou o filme uma merda, mas ganhou um Oscar por ele.
ATORES
Como um diretor que trabalhava com roteiros nos quais eu mesmo colaborava, o que pedia aos atores era muito simples: “Decore suas falas”.
Isso me lembra de uma história. George Bernard Shaw estava dirigindo uma montagem de sua peça Pigmaleão, com um ator muito ilustre e conhecido no elenco, o senhor Fulano.
O sujeito aparece no ensaio meio bêbado e começa a inventar um pouco. Shaw ouviu aquilo durante um tempo e então gritou: “Pare! Pelo amor de Deus, por que diabos o senhor não decorou as falas?”.
O senhor Fulano respondeu: “De que diabos o senhor está falando? Conheço as minhas falas”.
E Shaw gritou de volta: “Sim, o senhor conhece as suas falas, mas não as minhas”.
ROTEIRISTAS
Quando trabalhei para a Paramount, o estúdio tinha um exército de autores contratados – cento e quatro! Trabalhavam no Prédio dos Escritores, no Anexo dos Escritores e no Anexo do Anexo dos Escritores. Todos nós escrevendo! Não ganhávamos altos salários, mas escrevíamos.
Era divertido. Faturamos um pouco. Alguns, como Ben Hecht, faturaram muito. Todos devíamos entregar onze páginas toda quinta-feira. Por que na quinta? Vai saber! Por que onze páginas? Sabe-se lá! Mais de mil páginas eram escritas por semana.
AUTOR
Costuma-se considerar que a criação é do diretor porque é ele o responsável pelo produto final que vai às telas. Trata-se, mais uma vez, daquela estúpida teoria do autor, que diz que o diretor é o autor de um filme.
Mas o que um diretor filma – a lista telefônica? Os roteiristas se tornaram muito mais importantes quando o cinema ganhou som, mas têm precisado batalhar muito para receber o crédito que merecem.
NINGUÉM É PERFEITO
Diamond e eu estávamos escrevendo a cena final de Quanto mais Quente Melhor uma semana antes de ser rodada. Tínhamos chegado até a situação em que Lemmon tenta convencer Joe B. Brown de que não pode se casar com ele.
“Por quê?”, diz Brown.
“Porque sou fumante!”
“Por mim, não tem problema.”
Finalmente, Lemmon arranca a peruca e grita com ele: “Sou homem! É porque sou homem!”.
Diamond e eu estávamos na nossa sala, trabalhando juntos, esperando que a próxima fala – a resposta de Joe B. Brown, a fala final do filme – nos ocorresse.
Então eu o ouvi dizer: “Ninguém é perfeito”. Pensei um pouco e disse: “Bem, vamos deixar assim, ‘Ninguém é perfeito’, por enquanto. Mas só por enquanto. Temos uma semana inteira para pensar sobre essa frase”.
Pensamos durante uma semana inteira. Nenhum dos dois conseguiu algo melhor, de modo que filmamos a cena, mesmo sem estar completamente satisfeitos.
Quando o filme foi exibido, a fala final provocou uma das maiores gargalhadas que jamais ouvi num cinema. Mas simplesmente não tínhamos acreditado nela quando a escrevemos; não conseguíramos prever, simplesmente, que funcionaria. “Ninguém é perfeito!” Tinha vindo tão fácil, apareceu e pronto.

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