“A Culpa É das Estrelas”: veja o filme e leia o livro (e o roteiro)

tfios1

Eu chorei mais lendo algumas pobres críticas sobre A Culpa É das Estrelas publicadas em jornalões brasileiros do que propriamente na sessão do filme. E olhe que salguei bastante a camisa naquela cena do “funeral fake”.

Você certamente já sabe que John Green, o autor do livro, e todos os envolvidos no longa-metragem adaptado da obra dele são uns pulhas que vieram ao mundo apenas para fazer a plateia se derreter em lágrimas – por puro sadismo ou vontade de faturar algum.

A capacidade narrativa, o talento dos atores, a pertinência da história e a esperteza dos diálogos não têm nada com isso. A culpa é da ganância desenfreada dos realizadores. E ponto final.

Parece ser isso que algumas pessoas pensam por aí. Pior: escrevem bobagens nos maiores jornais do país.

Situando: A Culpa É das Estrelas, dirigido por Josh Boone, narra a trajetória do amor entre Hazel Grace (Shailene Woodley) e Gus (Ansel Elgort), dois jovens com câncer. Não precisa continuar pensando, a lembrança óbvia é mesmo do hit Love Story (1970), de Arthur Hiller.

Confesso que tinha feito uma comparação de textos e escrito certa tese sobre por que os críticos nacionais consolidados (enfim, os empregados) desprezam com tanta ênfase alguns fenômenos estrangeiros e/ou não conquistam espaço para fazer uma reflexão decente sobre esses blockbusters.

Mas prefiro deixar a análise (bem fácil, na verdade) para o nobre leitor.

Comparem essa crítica do maior jornal brasileiro sobre A Culpa É das Estrelas com uma que foi publicada no principal diário norte-americano (e do mundo). Por favor, não levem em conta o gosto pessoal ou o gênero da obra. Apenas percebam a profundidade de cada um, a capacidade de compreensão do fenômeno e o estilo de escrita (e referências).

Pois é. Problema de falta de papel ou reflexão? Talvez as duas coisas, não?

Eu também chorei mais quando fui ler o roteiro do filme, escrito por Scott Neustadter e Michael H. Weber. Eu não sei o que andam ensinando nas aulas de roteiro da USP ou da Faap, mas recomendo a leitura (rapidíssima) da obra dessa dupla.

Lá você encontra certa elegância, bons diálogos, um clima envolvente e muita honestidade. A história vem limpa do começo ao fim, cumprindo em cada página a sua função narrativa, entregando o que promete e jamais desprezando o espectador – além de ser bem escrito pra caramba.

Há rubricas deliciosas que nos pintam os personagens com enorme clareza e a captura de um ritmo realista da conversa (inteligente!) entre os adolescentes que raramente conseguimos encontrar nas telas.

É muito difícil escrever um treco assim. Muito, muito difícil. Ao contrário do que alguns podem pensar, esse jogo de cintura do roteiro norte-americano, com tudo funcionando feito um relógio suíço comandado por um inglês, é fruto de estudo, técnica e sentimentos. Tente aí suspender a descrença dessa história e vamos ver como você se vira.

Você não precisa gostar muito menos fazer algo assim. Mas se existe algum interesse por roteiro, vale saber como essas coisas são feitas (aqui o texto completinho).

Também chorei quando tentei encontrar alguma coisa parecida na lista das maiores bilheterias do cinema brasileiro dos últimos anos. Nem sombra.

Como formar público se desprezamos (ou não sabemos fazer) algo como A Culpa É das Estrelas? Será que uma indústria cinematográfica sobrevive sem essa comunicação com o jovem?

Não gosto de comparações entre livro e filme (detesto, na verdade). Mas esse artigo da Vulture traz tantos pensamentos sobre as imagens da obra que vale a pena ser lido (por quem já viu o longa).

Por fim, quero destacar que não curto a maneira como foi retratado o personagem de Willem Dafoe (o escritor). Acho que a pegada surreal surgiu deslocada do resto, subtraindo parte da sutileza e de certo realismo do filme – apesar da casa ficar arrumada no final.

E chorei com a interpretação de Shailene Woodley. Que garota espetacular. Aliás, aqui um bom perfil dela e de outra jovem extraordinária, Brie Larson (Short Term 12 é mais um exemplar surpreendente e enérgico com jovens).

Tudo isso pra falar que ainda bem que surgiu neste ano Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro, e Eles Voltam, de Marcelo Lordello. Assim a molecada nacional não fica boiando no limbo do esquecimento.

Em tempo: está em cartaz o melhor brasileiro do ano, O Lobo Atrás da Porta.

 

2 comentários em ““A Culpa É das Estrelas”: veja o filme e leia o livro (e o roteiro)

Adicione o seu

Deixar mensagem para oroteiro Cancelar resposta

Blog no WordPress.com.

Acima ↑