“Homeland”, França e Estado Islâmico

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Chris Brancato, o roteirista da série Narcos, esteve no Brasil para palestras e debates. O jornalista Maurício Stycer teceu alguns comentários sobre o que ouviu do autor (você pode ler aqui).

Parece que o interesse pelo roteiro (de filmes ou séries) tem aumentado. Começamos a escutar com mais atenção os autores, cursos de escrita surgem em esquinas antes abandonadas e o governo injeta dinheiro diretamente na manjedoura, onde novos projetos começam a florescer.

Além de chamar a atenção para a profissão, a vinda de caras como Brancato joga um pouco do pó da realidade em roteiristas deslumbrados que acreditam que eles são capazes de realizar um grande filme ou série.

Em alguns lugares, já dá pra escutar uma super valorização do roteirista, como se diretores e produtores fossem cavalgaduras, bichos do mato incapazes de perceber o talento que emerge de páginas e páginas da mais pura genialidade.

Stycer pontua bem o jogo entre direção, roteiro e produção. Quando essa partida é bem jogada, com Neymar de um lado, Messi do outro e Guardiola no banco, a chance de espetáculo é tremenda. Mas se alguém ali se mostrar fominha, talvez a turba saia descontente.

O que precisa acontecer agora é começarmos de fato a ver esses novos trabalhos que estão sendo gerados nos núcleos criativos, nas mesas das produtoras ou nas garagens daquele amigo que abandonou o jornalismo.

Mas aí estamos danados. Infelizmente, economicamente o Brasil não é a Rede Globo. Então, a indústria de séries e filmes segue emperrada. Demoramos demais para exibir algo, descartar as coisas ruins e apostar naquilo que parece ser bom.

Eu tenho a sorte de nos últimos dois anos ter escrito (com a ajuda de muita gente, claro) 65 episódios de duas séries diferentes. Todos foram gravados. Metade já foi ao ar. Só assim consegui entender os erros, apreciar os três acertos, brigar com 127 pessoas e pedir desculpas para 126.

Exterminei o preconceito que eu tinha em relação a muitas coisas (ei, diretores são caras legais e também querem o melhor para o projeto). Perdi cabelo (mentira, já era careca), passei a beber um pouco mais, confirmei minha cisma em relação a algumas pessoas e, principalmente, passei a achar que atores podem ser meus amigos (eles amam seus personagens tanto quanto você, controle um pouco o ciúmes, cara).

E se todas essas 1.690 páginas nunca tivessem sido gravadas? E se elas não tivessem sido discutidas nas 456 reuniões de produção? O que aconteceria com a minha escrita hoje?

Tá, poderia ser melhor. Mas creio que as chances seriam mínimas.

Só vamos aprimorar nossos roteiros quando eles forem realizados.

A diversidade é que faz a indústria prosperar.

Temos muita TV pra assistir? Ainda bem.

Essa urgência faz da TV norte-americana a melhor do mundo (o cinema também é o melhor do mundo, mas não vou falar isso aqui).

Só assim, produzindo loucamente, a quinta temporada de Homeland, por exemplo, consegue colocar no ar justamente a questão da Síria, do Estado Islâmico, dos atentados no solo europeu, da Rússia de Putin, discutindo praticamente em tempo real os trágicos eventos que acabaram de acontecer na França.

Aliás, a nova temporada está espetacular (mesmo com a gracinha de colocar um episódio chamado “Better Call Saul”).

O episódio 7 de Master of None é outro exemplo de discussão atual: o assédio que as mulheres ainda sofrem diariamente.

Enquanto isso, o dia-a-dia parece ser gerado apenas na tela da Globo. Ok, vamos ser justos: Psi Santo Forte conseguem registrar a violência do cotidiano brasileiro de maneira bastante atual e satisfatória.

Mas acho que ainda dialogamos pouco com o presente. Não podemos demorar muito pra estrear as produções que estão sendo geradas. E são muitas.

*

Pra não perder o pique, aqui Aaron Sorkin discute alguns de seus melhores diálogos e sequências. A abertura de Studio 60 on the Sunset Strip (aliás, série bacana demais para roteiristas) traz uma das críticas mais contundentes sobre a qualidade da televisão.

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